Os grandes reservatórios de água do país, nas regiões sul e centro-oeste, estão com níveis muito baixos e, para suprir a escassez, os mananciais baianos de Sobradinho e Lagoa de Itaparica, na bacia do Rio São Francisco, podem ser utilizados. As águas da bacia já atenderam em dezembro de 2020 a demanda das regiões em crise e podem ser novamente requisitadas no final deste ano. O fato preocupa o Comitê da Bacia Hidrográfica do São Francisco (CBHRS), que alerta para prejuízos à população ribeirinha e risco de crise na Bahia e no Nordeste
Os sistemas de abastecimento hidrelétrico são interligado nacionalmente, a Agência Nacional de Águas e Saneamento Básico (ANA) decidiu flexibilizar as restrições hidráulicas na usina hidrelétrica de Sobradinho, Itaparica e Xingó, entre Alagoas e Sergipe, para garantir capacidade de suprimento da demanda proveniente de regiões de crise hídrica. A resolução, que passou a valer no dia 15 de junho, prevê a retenção de água até novembro.
A medida permite que a faixa de operação Normal passe para a de Atenção quando o reservatório da hidrelétrica de Sobradinho atingir volume útil inferior a 60% sem necessidade de aguardar o 1º dia útil do mês seguinte, podendo ser praticada defluência mínima de 800m³/s em Xingó. Para setembro, a Resolução ANA nº 81/2021 permite a operação de Xingó com vazões máximas médias mensais de 1.500m³/s, enquanto em outubro e novembro está autorizada a prática de vazões máximas médias mensais de 2.500m³/s.
Para o presidente do CBHRS, Anivaldo de Miranda, a Bacia do São Francisco não tem capacidade para suprir a demanda das outras regiões do país que estão em crise e a resolução da ANA é prejudicial. Ele explica que agora, a bacia terá que operar com vazão de 800 m³/s, retendo água para, entre setembro e outubro, praticar vazões de 1.500 e 2.700 m³/s, liberando água para atender à crise do Sudeste, que se destaca na Bacia do Rio Paraná. Vale ressaltar que a mínima histórica de vazão era de 1.300 m³/s em Xingó.
“A situação atual dos reservatórios ainda é confortável. Entretanto, como o sistema de geração de energia elétrica no Brasil é interligado, a crise do Sudeste acaba nos atingindo também. Nós estamos tendo que economizar água para atender em setembro e outubro a demanda da Bacia do Rio Paraná”, pontua o presidente.
Para a geração de energia, é preciso que haja um grande movimento de água e a exigência de uma baixa vazão significa justamente o oposto: represamento de água. “A Bacia do São Francisco, no sistema interligado, está tendo um papel que vai além da sua capacidade. À medida que a bacia fica sendo usada para resolver os problemas do Sudeste, é claro que haverá prejuízos. Quando, recorrentemente, você tem que usar a Bacia do São Francisco, que é uma bacia do semiárido, para atender emergências na região onde mais chove, é porque tem alguma coisa errada”, coloca Miranda.
O presidente ainda alerta que o suprimento da demanda do Sudeste pode levar a Bacia do São Francisco ao cenário de crise vivido entre 2013 e 2019, quando Sobradinho chegou perto de 1% do volume útil. “Em 2020 tivemos o primeiro ano de alívio depois de quase sete anos de penúria. Mas, parte de todo esse volume que poupamos com muito sacrifício foi usada em dezembro para gerar energia e atender a crise da Bacia do Paraná. Os reservatórios que estavam quase em 100% baixaram para 60%. Estamos voltando para esse cenário; o país está levando a crise de uma região para outra”, argumenta.
Eduardo Topázio diretor de Recursos Hídricos e Monitoramento Ambiental do Instituto do Meio Ambiente e Recursos Hídricos (Inema), diz que a Bahia não vive atualmente uma situação de preocupação quanto ao abastecimento de água, mas pode vir a enfrentar uma crise energética caso precise compensar a falta de água para geração de energia em outras regiões. “A nossa força hidráulica não consegue compensar porque grande parte do fornecimento de energia no país vem do Sudeste, que concentra a escassez. Não temos como compensar essa crise do Sudeste”, afirma.
Mas, segundo ele, a medida da ANA é uma forma de assegurar o abastecimento local para o final do ano, já que inicia-se, no segundo semestre, o chamado “período seco”, que deve durar até novembro. “A retenção de agora é uma garantia adicional para o futuro. A proposta é que a gente volte ao cenário anterior, que já vivemos. Não é nada novo, mas vamos retomar como precaução. Vale lembrar que, este ano, estamos começando esse período seco numa condição melhor do que a do ano passado”, diz.
A Secretaria De Infraestrutura Hídrica e Saneamento (SIHS), afirmou, através de nota, que a situação atual dos principais reservatórios de água do estado da Bahia é confortável para a época do ano, tanto em relação ao abastecimento humano quanto aos outros usos (agricultura, indústria, serviços e geração de energia elétrica).
“Observa-se que o quadro atual do conjunto dos 22 reservatórios
baianos considerados estratégicos é de relativa segurança hídrica. Assim
é que temos três com 100%, 15 entre 40 e 100%, dois entre 20 e 40% e
dois abaixo de 20%, em situação crítica. Estes dois não afetam
diretamente o abastecimento, deste modo não vemos necessidade de se
adotar medidas adicionais até a chegada do próximo período de recarga,
previsto para o mês de novembro, pois neste intervalo está descartado
uma crise hídrica no Estado da Bahia, diferente do que está ocorrendo no
Sudeste e Oeste do país” informou Leonardo Góes, titular da SIHS. *Correio da Bahia
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