Os primeiros estudos brasileiros que usam plasma convalescente para tratamento contra o coronavírus estão em fase final. A terapia consiste na transfusão do sangue (plasma) de uma pessoa que já foi infectada e está curada, para um paciente que ainda está em tratamento da Covid-19. Assim, os anticorpos produzidos pelo indivíduo recuperado fornecem imunidade ao paciente que enfrenta a doença.
Essa estratégia de tratamento não é novidade na medicina, tendo sido utilizada em outros casos de infecções virais como ebola, H1N1 e há mais de 100 anos contra a gripe espanhola.
Desde 2020, o Hemocentro de Brasília participa da pesquisa, juntamente com outras instituições brasileiras e até internacionais. Os candidatos ao estudo foram escolhidos, de forma sigilosa, a partir de inscrição voluntária disponibilizada no site da instituição. No total, 450 pessoas se cadastraram como possíveis doadores, mas os estudos foram realizados com 34 voluntários, sendo 15 doadores e 19 receptores.
O hematologista e chefe da divisão técnica do Hemocentro de Brasília, Alexandre Nonino, disse que os estudos ainda apresentam resultados divergentes. “Temos dados animadores e outros que não mostram melhoras no quadro, seja redução da evolução para casos graves, seja redução da mortalidade. Seguindo os estudos, provavelmente, para funcionar, ele deve ser usado precocemente nas infecções, até 72 horas do início dos sintomas.” Segundo o médico, os estudos que mostraram melhor impacto foram aqueles em que o plasma foi usado em pacientes não tão graves, mas no início dos sintomas.
Ainda segundo Nonino, a maior dificuldade do estudo foi captar pacientes aptos a receber o plasma convalescente, pois muitos não procuram o hospital nos primeiros sinais de infecção do coronavírus. “Muitas vezes os pacientes demoravam a chegar no centro tratador. Com a superlotação dos hospitais na primeira onda, havia uma dificuldade em termos acesso aos pacientes internados, pois boa parte já estava há mais de 10 dias infectados. Mas esse problema no estudo aconteceu no mundo inteiro, e então foi criado um consórcio de instituições de pesquisa para termos a estatística correta da análise”, disse.
O uso do plasma de pacientes que se recuperam da Covid-19 também foi utilizado no Hospital Regional da Asa Norte (Hran), em Brasília. Referência em tratamento do coronavírus na capital federal, a infectologista Ana Helena Germóglio disse que os resultados não foram positivos. “É um tratamento bem diferente e os estudos ainda são bem inconclusivos. No HRAN não deu certo, isso aumentava o volume hídrico dos pacientes. Os internados que utilizaram tiveram problemas.”
O resultado da metanálise final será publicada pelo Hemocentro de Brasília juntamente com outros centros de pesquisa brasileiros e internacionais. E, então, será decidido se é válido ou não o uso de plasma para tratamento contra o coronavírus.
A Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) e o Ministério da Saúde autorizam os experimentos e uso realizados a partir do plasma sanguíneo, também assegurado por Lei Federal (10.205/2001). Porém, as instituições lançaram a nota técnica 33/2021, que atualiza uma normativa de abril do ano passado, que foi elaborada antes da existência de vacina com eficácia comprovada contra o coronavírus. As recomendações atuais tratam sobre o uso de plasma convalescente de indivíduos vacinados contra a Covid.
Segundo nota da Anvisa, “até o presente momento, os estudos de eficácia do uso de plasma convalescente para o tratamento de pacientes com Covid-19 são preliminares, não sendo possível comprovar definitivamente a sua eficácia, carecendo de mais evidências controladas para comprovação de uso terapêutico.”
Além de ter o diagnóstico para a infecção pelo novo coronavírus, o potencial doador precisa cumprir todos os critérios de doação de sangue estabelecidos pelo Ministério da Saúde e ter tido a doença em no máximo seis meses da coleta do plasma, ou em até 15 dias, a depender da instituição pesquisadora.
As condições básicas de doação de plasma convalescente seguiram, praticamente, os critérios convencionais de doação de sangue como ter entre 16 e 60 anos, pesar no mínimo 60 quilos, se mulher, não ter histórico de gestações e ter diagnóstico laboratorial confirmado de infecção por SARS-Cov-2. Os pacientes que tiveram manifestações graves causadas pelo coronavírus como choque séptico, parada cardíaca e intubação não foram aptos a participar.
Riscos da transfusão de plasma
O risco de transfusão de plasma por recuperados do coronavírus apresenta os mesmos riscos de transfusão de sangue. Entretanto, quando se trata da transfusão de sangue convalescente, a reação adversa mais comum é a alergia à proteína do plasma e a complicação mais séria é a inflamação aguda do pulmão.
“Todo sangue coletado passa por testagem para hepatite B, hepatite C, hepatite A, sífilis, HIV, HTLV. A transfusão de plasma pode levar a alguma alergia porque existem anticorpos ali dentro. Existem riscos de síndrome respiratória e complicação cardíaca”, afirma a infectologista Ana Helena Germóglio.
Já teve covid-19? Doe plasma e faça parte do estudo
O Instituto Butantan e o governo de São Paulo estão dando continuidade ao experimento. O Hemocentro da Universidade Estadual de Campinas (UniCamp) é um dos pontos de coleta para pessoas que já tiveram Covid-19 e querem realizar a doação de plasma.
Para a doar, é necessário realizar o agendamento prévio (clique aqui). Segundo o Hemocentro, o doador precisa ter se contaminado pela doença e estar curado há mais de 30 dias, os critérios são os mesmos adotados para uma doação de sangue comum e podem ser conferidos no site da instituição. Clique aqui para saber outros pontos de coleta em São Paulo.
Quem recebe o plasma?
- Pacientes elegíveis: Pessoas que apresentem sintomas da Covid-19 há no máximo 72 horas.
Público-alvo
- Pacientes imunossuprimidos: Especialmente aqueles tratados com anticorpos monoclonais anti-CD20.
- Pacientes idosos: Maiores de 60 anos.
- Pacientes com comorbidades: Diabetes mellitus, hipertensão arterial, coronariopatia e obesidade.
*Brasil 61
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